" Pastora de núvens fui posta a serviço
por uma campina tão desamparada
que não principia nem também termina,
e onde nunca é noite e nunca madrugada"

Destino - Cecília Meireles





segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Um Menino

      Seguindo a proposta do blog Café Samedi,que divulga uma imagem e sugere a criação de um mini conto,e dando continuidade ao tema de minha última postagem que ainda não saiu de minha cabeça e ainda me causa fasciculações, para a imagem a seguir escrevi este mini conto,prometendo voltar da próxima vez com temas que me cause fasciculações mais alegres:
                                   
                      
    Um Menino

    Agora que tudo acabou, ele finalmente pode respirar aliviado, dormir tranqüilo, finalmente não precisava mais guardar segredo nenhum.
    -“Linda criança!”, todos diziam, “... só um pouco abatida!”, outro comentava. Foram longos anos tormentosos! Seis exatamente, dos seis aos doze, e como lhe ensinaram esses anos, ensinaram-lhe até demais,mais do que forte ele ficou rígido,mas do que maduro ele ficou velho.
   Na primeira vez em que a fechadura de seu quarto foi aberta no meio da madrugada, o pobre não entendeu nada, mas depois de tanta repetição ele já nem queria mais entender. Mamãe perdeu a paciência com suas notas baixas na escola e com sua falta de amigos e de tanto que ela repetiu que ele era um burro e incapaz, ele acreditou. Mas ele no fundo sabia que era bom. Como era bom! Sabia andar e sentar normalmente como se nada tivesse acontecido e como se nada doesse, sabia ficar quieto, nenhuma criança ganharia dele na brincadeira de calar a boca, ele até tentava sorrir e incrivelmente até conseguia de vez em quando, mas quando analisou tudo isso, sabiamente ele percebeu que não era mais uma criança. Não, não era mais. Um dia ele havia sido, mas mal podia se lembrar.
    Ele deixou tanto de amar a quem o cercava que se julgou incapaz disto também, um dia ele pensou em Deus, mas seu conceito ainda era confuso. Aos doze anos, ele jurava poder ver rugas e cabelos brancos em si, também via nitidamente seu cansaço, seus olhos roxos, mas eram marcas que só ele podia enxergar. Ninguém conseguia notar, talvez se ele as mostrasse... Não, não! Ele era bom em esconder, era a única coisa que ele sabia fazer e o faria até quando fosse necessário. Quando veio a moça do governo para separar sua família, ele escondeu. Quando a tia da escola e a moça do hospital ameaçaram chamar a polícia, ele escondeu. Mamãe o amaria por isso, ele era bom, ele sabia!
     Um dia finalmente, na mesa do café da manhã enquanto todos comiam, entrou um sujeito em casa, um sujeito sujo, com uma arma, ele falava algo sobre dinheiro e dívida, mas o menino não estava prestando atenção, ele só conseguia ver a cara de medo do “papai”, como ele estava desesperado, ele tremia. Agora ele era tão frágil, tão pequeno, agora ele não sorria maliciosamente, nem gritava,agora ele chorava,chorava alto, logo ele que sempre disse que homem não chorava. E o homem não teve pena, ele não teve, ele atirou uma, duas vezes... Mamãe se descabelou se atirou ao chão,chorou,gritou e disse que a vida dela também tinha acabado, mas o menino não... o menino sorria, sorria sinceramente e com vontade como há anos não fazia. O menino agora era livre, embora seu retrato não fosse mais de um menino, agora ele era um velho, um velho cansado, maltratado, mas livre.

6 comentários:

  1. Gostei do conto. A natureza implícita dele (à lá Hemingway) só faz torná-lo ainda mais forte e triste. Parabéns e bem-vinda, Bárbara! Espero mais participações suas ;-
    Abçs

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  2. Muito Obrigada de verdade!!!
    Participarei sempre que me senti inspirada!
    Abraço!

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  3. Parabéns, Bárbara! É uma honra tê-la no Samedi, o conto é forte, escrito com uma sinceridade incrível, muito belo mesmo, até mais!

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  4. Muito Obrigada Bruno,fico muito feliz ouvindo isso de vcs!
    bjo

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  5. Ficou muito legal Bárbara! Parabéns e sucesso!!

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  6. Poxa, é lindo bárbaraaa!!!! Eu amei seu blog! Mto sucesso pra vc nega, vc merece!!!!

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